Assédio moral - Carolina Ragazzi, ex-vice-presidente do Goldman Sachs no Brasil, rompeu o silêncio sobre o assédio moral que diz ter sofrido.
Assédio moral – A executiva Carolina Ragazzi, ex-vice-presidente do Goldman Sachs no Brasil, rompeu o silêncio sobre o assédio moral que diz ter sofrido após se tornar mãe. Aos 37 anos, com uma carreira consolidada no competitivo setor de fusões e aquisições, ela afirma que passou a ser sistematicamente excluída de projetos, alvo de piadas machistas e preterida em promoções após o nascimento de seus filhos.
Ragazzi ingressou no Goldman Sachs em 2011 e, cinco anos depois, já ocupava o cargo de vice-presidente e chefiava a área de varejo. Segundo ela, tudo mudou após a primeira licença-maternidade, quando começou a ser criticada por sair no horário para cuidar da filha, ainda que retomasse o trabalho de casa até tarde.
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Pouco a pouco, fui sendo minada e excluída das rodas de decisão. “Fui tendo meu poder esvaziado, obviamente, com o tempo isso afetou minha remuneração. Mas tudo foi acontecendo de forma muito gradativa. Não foi da água para o vinho”, relata. “Na maior parte das vezes, havia um discurso que isoladamente parecia fazer sentido. Mais para frente eu fui descobrindo que era mentira, foi ficando recorrente. Sempre era uma manipulação brutal.”.
Além das exclusões e críticas, Ragazzi afirma que foi vítima de bullying em grupos de WhatsApp, além de ter tido sua remuneração reduzida.
A situação teria se agravado após o segundo filho, em 2019. Ao retornar da nova licença, foi retirada de uma operação estratégica sob a justificativa de que, por estar amamentando, as reuniões marcadas para o início da manhã seriam prejudiciais.
“A resposta dele foi como se fosse protetiva para mim. Ele disse que eu conhecia bem o cliente e que eles não respeitam nosso fuso horário e marcam as reuniões para seis da manhã e que não me faria bem, porque eu estava voltando de licença”, conta. “Eu insisti, falei que ele me conhecia, que sou pau para toda obra, que aquele projeto era vital para a minha promoção. Aí ele mudou a narrativa.”
O ápice do assédio, segundo a ex-executiva, ocorreu em 2022, quando entrou numa videoconferência sem ser vista e ouviu críticas duras de colegas que a responsabilizavam por um contrato perdido. Ela teve uma crise de pânico e, meses depois, foi afastada por licença médica. Ao retornar, protocolou denúncia formal com documentos e testemunhos. Pouco depois, foi demitida.
Banco nega
Procurado, o Goldman Sachs afirmou, por nota, que as alegações de Ragazzi são falsas. “No Goldman Sachs, temos políticas generosas de licença para apoiar nossos funcionários em diversos momentos importantes da vida e não toleramos qualquer forma de retaliação contra um colaborador que faça uso dessas licenças. Contestamos veementemente essas alegações, que são falsas. Não seria apropriado comentar as circunstâncias específicas ou o desempenho de um funcionário em particular”, disse o banco no comunicado.
Desigualdade estrutural
A denúncia de Ragazzi se soma a outras ações envolvendo o banco. Em 2023, o Goldman Sachs pagou US$ 215 milhões para encerrar uma ação coletiva movida por mais de 2.800 mulheres nos Estados Unidos, que acusavam a empresa de desigualdade salarial e nas promoções.
No Reino Unido, o banco é um dos que apresenta maior disparidade de remuneração entre homens e mulheres: em 2023, elas recebiam, em média, 54% menos por hora trabalhada.
No Brasil, segundo o IBGE, o setor financeiro é o que apresenta a maior diferença salarial entre gêneros: as mulheres ganham, em média, 68,7% menos que os homens. A maternidade intensifica a desigualdade: mães enfrentam mais barreiras para promoções e têm maiores chances de serem excluídas do mercado.
Para a advogada especializada em gênero Mayra Cotta, o caso de Ragazzi revela um padrão recorrente. “O que se celebra, quase sempre, é a mulher que conseguiu performar como se não tivesse filhos — ou que pôde pagar para que outra mulher cuidasse deles”.
“O caso de Ragazzi ilustra bastante, com muita clareza, o preconceito contra a maternidade que existe em absolutamente todas as empresas — algumas com mais força do que outras, mas que é uma realidade para todas as mães que estão no mercado de trabalho”, afirma a advogada.
(Com informações de Universa UOL)
(Foto: Reprodução/Freepik/zinkevych)