Brinquedos chegam ao mercado como alternativa ao tempo de tela, mas levantam questionamentos sobre privacidade, educação e vínculos afetivos
IA – A Curio se apresenta como “uma companhia mágica onde brinquedos ganham vida”. Localizada em Redwood City, na Califórnia (EUA), a startup aposta em um nicho crescente: bichos de pelúcia equipados com chatbots de inteligência artificial.
Os brinquedos, voltados para crianças a partir de três anos, possuem uma caixa de voz conectada à internet e embutida nas costas, que permite interações semelhantes a uma conversa real. Entre os personagens estão Grem, um alienígena estilizado; Grok, um foguete de bochechas rosadas; e Gabbo, um console de videogame em versão fofa. Cada um é vendido por US$ 99 (cerca de R$ 534).
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Durante uma demonstração, Eaton, cofundador da empresa, ao lado de Misha Sallee, posicionou Grem sobre a mesa. “Ei, Grem, o que são essas manchas no seu rosto?”, perguntou. O boneco respondeu com naturalidade: “Esses são meus pontos rosa especiais. Eu ganho mais conforme envelheço. Eles são como pequenas marcas de diversão e aventura”. A interação, por alguns instantes, criou um vínculo inesperado entre humano e máquina.
Uma alternativa às telas?
A Curio e outros fabricantes de brinquedos com IA defendem que seus produtos podem substituir parte do tempo gasto diante de tablets ou televisores. O design e a voz de Grem foram desenvolvidos pela cantora Grimes, que, em um vídeo promocional, afirma: “Como mãe, obviamente não quero meus filhos na frente de telas, e estou muito ocupada”.
A proposta é que as pelúcias funcionem como “companheiros”, incentivando brincadeiras mais ativas. Em um dos vídeos de divulgação, uma criança corta limões enquanto Gabbo, sentado ao lado, comenta: “Hora da limonada é a melhor hora!”.
Além da Curio, outras empresas oferecem produtos semelhantes. Há versões em formato de ursos, robôs, capivara, dinossauro e até fantasma. Nomes como ChattyBear e Poe, o “urso contador de histórias com IA”, já estão no mercado. Em breve, personagens icônicos podem se juntar a essa tendência: a OpenAI anunciou parceria com a Mattel para criar brinquedos interativos inspirados em marcas como Barbie e Ken.
Entre encantamento e preocupações
Se, por um lado, os brinquedos prometem estimular a imaginação, por outro levantam dúvidas sobre privacidade e limites parentais. Todas as conversas são transcritas e enviadas para o celular do responsável, segundo a Curio.
A empresa garante que os dados não são usados para outros fins, mas a política de privacidade aponta caminhos de compartilhamento com empresas parceiras, como OpenAI e Perplexity AI.
Há ainda os riscos de o chatbot sair do roteiro, como aconteceu em um teste em que um Grok respondeu a perguntas sobre substâncias perigosas, descrevendo onde poderiam ser encontradas.
No fim, o dilema permanece: enquanto as crianças acreditam estar trocando segredos com um amigo especial, seus pais acompanham tudo em segundo plano.
Quando o módulo de voz de Grem foi retirado e guardado, o boneco voltou a ser apenas um bicho de pelúcia. Na manhã seguinte, sem a tecnologia, os filhos da repórter inventaram suas próprias regras de brincadeira. E logo trocaram Grem pelo coro animado: “Hora da TV! Hora da TV!”.
(Com informações de Folha de S. Paulo)
(Foto: Reprodução/Freepik/Imagem gerada por IA)