Proposta de Emenda Constitucional já possui cerca de 100 assinaturas de parlamentares, de acordo com a autora do projeto
Semana de 4 dias – Uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) protocolada no Congresso Nacional propõe a redução do limite de horas semanais trabalhadas no Brasil, para possibilitar o modelo de quatro dias de trabalho, e o fim da jornada de trabalho 6×1, com apenas uma folga na semana.
A proposta é de autoria da deputada federal Erika Hilton (PSOL-SP). O texto, para ser discutido na Câmara e no Senado, precisa do apoio de ao menos 171 assinaturas de parlamentares, já propõe uma mudança na Constituição Federal. De acordo com a equipe da deputada, cerca de 100 colegas já assinaram a PEC, em meio à popularização do tema nas redes sociais, aumentando a pressão sobre deputados e senadores.
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“A alteração proposta à Constituição Federal reflete um movimento global em direção a modelos de trabalho mais flexíveis aos trabalhadores, reconhecendo a necessidade de adaptação às novas realidades do mercado de trabalho e às demandas por melhor qualidade de vida dos trabalhadores e de seus familiares”, diz trecho da proposta.
A parlamentar diz que o desenho inicial que busca apoio no Congresso não quer “cravar um modelo exato”, mas “provocar a discussão no Parlamento” sobre a jornada de trabalho brasileira. Hilton também tenta emplacar uma audiência pública na Câmara para tratar do tema e buscar um “denominador comum” sobre a questão no Congresso.
Mudanças contidas na PEC
A definição da carga horária atual está estabelecida no artigo 7º da Constituição Federal, que fixa que expediente do trabalhador ou trabalhadora como “não superior a oito horas diárias e quarenta e quatro semanais”.
Na proposta inicial da PEC, o objetivo é reduzir esse limite para 36 horas semanais, sem alteração na carga máxima diária de oito horas. A deputada defende que é possível trabalhar com a margem de 36 horas semanais.
Mas a parlamentar acrescenta que o número tem o objetivo principal de iniciar o debate “para que o parlamento busque uma análise do que é melhor, levando em consideração a vida da classe trabalhadora”.
A proposta enfatiza que a redução da carga horária semanal deveria ocorrer sem diminuição salarial, ponto essencial para “preservação do poder de compra e a estabilidade econômica dos trabalhadores, essenciais para o sustento de suas famílias e para a dinamização da economia como um todo”.
Tendência global
O texto defende que a redução da jornada melhoraria a qualidade de vida dos trabalhadores e geraria ganhos de produtividade, o que aliás se comprova pelos resultados obtidos em testes do modelo ao redor do mundo e no próprio Brasil. A PEC, inclusive, cita resultados de programas pilotos com o modelo 100:80:100, ou seja, 100% do salário, 80% da carga horária e 100% de produtividade.
No Reino Unido, estudo do ano passado com 2,9 mil pessoas que passaram a trabalhar no regime 4×3 indicou que 39% se sentiam menos estressados com a mudança de jornada e 71% reduziram sintomas de burnout. Para empresas, ganhos passaram pela redução da rotatividade dos funcionários e até no incremento na receita em comparação com os mesmos períodos anteriores, quando a jornada era mais extensa.
A proposição também sugere que a redução da carga de trabalho poderia gerar 6 milhões de postos de emprego. A PEC segue uma tendência global, visto que diversos países têm testado o modelo da semana de 4 dias de trabalho, com sucesso. O modelo também foi testado Brasil neste ano de 2024, e um teste está sendo desenhado para 2025.
Apesar de enfrentar críticas entre parlamentares de direita e de empresários, a ideia ganhou força nas redes sociais nos últimos dias. Durante o fim de semana, o tema ficou entre os mais debatidos no X.
“Eu espero que essas movimentações tenham algum tipo de impacto no Congresso. Eu vou voltar para lá para discutir mais essa demanda. Para mim, essa é uma movimentação de classe”, argumenta a deputada autora da PEC.
Teste no Brasil: mais lucro, produtividade e bem-estar nas empresas
O primeiro piloto brasileiro da 4 Day Week, organização que orienta empresas na implementação da semana de quatro dias de trabalho, chegou ao fim, com evento de encerramento realizado em meados de agosto. E os resultados foram considerados excelentes pelos organizadores.
“Todas as nossas expectativas com o projeto se realizaram”, avaliou Paul Ferreira, pesquisador da FGV, durante a cerimônia. Na ocasião, organizadores do projeto e representantes das organizações que participaram do piloto discutiram a experiência e apresentaram os resultados do experimento. A 4 Day Week seguirá monitorando alguns dos participantes nos próximos meses, mas já abriu as inscrições para uma segunda temporada do projeto, que deve começar em janeiro e terminar em julho de 2025.
“Nós vimos uma diferença muito maior na saúde mental dos profissionais no Brasil [do início ao fim do piloto] do que em outros países”, afirma Gabriela Brasil, diretora de comunicação da instituição.
No país, 87% dos participantes afirmam que o fim de semana estendido rendeu mais energia para realizar as tarefas do escritório, enquanto 73% relataram que o sentimento de exaustão decorrente do trabalho diminuiu. Além disso, 71% sentiram mais energia para estar com família e amigos no tempo livre.
Manutenção do modelo
Todas as empresas participantes afirmam que pretendem manter a semana de quatro dias. 46,2% delas vão aderir ao formato de modo permanente; 38,5% delas farão adaptações; e 15,4% vão estender o piloto para incluir mais equipes no esquema, por exemplo.
A 4 Day Week já realizou estudos semelhantes em países como Estados Unidos, Reino Unido, Canadá, Austrália e Nova Zelândia. No Brasil, 252 pessoas de 21 empresas participaram do projeto. Destas, 19 chegaram ao fim, visto que uma companhia do Rio Grande do Sul interrompeu a experiência por conta das enchentes no estado, enquanto outra suspendeu sua participação após ocorrer uma troca na diretoria da companhia durante o período.
Entre os participantes, há empresas de tamanhos e rotinas variados. A Inspira, por exemplo, pequena empresa de tecnologia que atende o setor jurídico, sempre adotou o modelo remoto e teve reuniões semanais. Por isso, foi mais fácil implementar a semana de quatro dias. “Agora, o que vemos são mais colaboradores motivados e menos colaboradores doentes”, conta Carolina Grimadi, líder de produto e UX design da empresa.
Já a editora Mol Impacto, que também é um negócio relativamente pequeno, sentiu dificuldade de encurtar a semana, mas conseguiu. “Por orientação da 4 Day Week, começamos [o piloto] com a nossa equipe mais atribulada, que mais interage com clientes e depende de agendas externas”, explica a CEO da editora, Roberta Faria. “Hoje, é a nossa equipe mais produtiva e organizada”, aponta.
A CEO afirma que a Mol alcançou um nível maior de satisfação com o trabalho e acrescenta que a principal motivação da empresa para implementar a semana de quatro dias não foi a retenção de talentos, mas sim a melhoria na qualidade de vida dos profissionais.
Repensando o expediente
Diretora da Reconnect e responsável pela iniciativa no Brasil, Renata Rivetti defendeu durante o evento de encerramento que a semana de quatro dias é, na verdade, um projeto de aumento de produtividade. “Ele tem muito mais a ver com aprimorar processos e aproveitar melhor o tempo”, afirma a executiva, “do que com transformar a quinta-feira na nova sexta”.
Em agosto de 2023, Rivetti deu uma palestra na sede do Sindpd-SP (Sindicato dos Trabalhadores em Tecnologia da Informação de São Paulo), em São Paulo, e descreveu o projeto e a necessidade de transformar a atual realidade do mercado de trabalho brasileiro.
“O modelo atual não gera aumento de produtividade e têm adoecido mentalmente os brasileiros”, defendeu, na ocasião, Renata. O Brasil é o 1º lugar do mundo em transtornos de ansiedade, 2º lugar mundial em casos de Síndrome de Burnout e o 5º em depressão.
“Tem pessoas que se sentem culpadas por ter um dia extra. ‘Nossa, não estou trabalhando, será que eu sou produtiva?’. A gente foi criada em uma sociedade que hoje acredita que não pode parar. Isso não é produtivo. Ao contrário, está levando a gente para um esgotamento. Essa é uma realidade”.
Durante a fase de preparação e planejamento do piloto, entre setembro e dezembro de 2023, Renata e outros especialistas promoveram workshops e mentorias às empresas participantes, para que elas soubessem como reorganizar o fluxo de trabalho e eliminar gargalos a fim de reduzir a carga horária dos colaboradores e focar nas entregas.
As empresas reduziram, por exemplo, a quantidade e duração de reuniões internas e externas, tornando os encontros mais objetivos. Também definiram com maior precisão as atividades de cada um no escritório, reduziram o microgerenciamento e tentaram melhorar a comunicação dos gestores com seus colaboradores. Além disso, passaram a priorizar certas tarefas em detrimento de outras.
A maioria das empresas participantes conseguiu estabelecer um dia de folga em todas as semanas do piloto, enquanto outras ofereceram folgas quinzenais ou mensais. Em média, a carga horária diminuiu para todos: passou de 42,8 horas semanais para 36,5. O resultado mostra que as participantes conseguiram, de fato, aproveitar melhor o expediente, e que os quatro dias úteis não ficaram mais longos para compensar a folga.
“Para que a semana de quatro dias funcione bem, cada um de nós precisa rever a maneira com que trabalha. Isso significa mudar rotinas e hábitos bem consolidados, não é fácil.”, acrescenta Paul Ferreira, lembrando que a transição para que esse modelo leva tempo e que é normal que haja resistência por parte de alguns empresários, acostumados ao modelo consolidado.
Resultados do piloto
O lado dos profissionais
– 86% dos participantes afirmam que estão enxergando mais propósito no trabalho;
– 80% notaram melhorias na própria criatividade e capacidade de inovação;
– 71,5% perceberam que a produtividade aumentou significativamente;
– 65,5% afirmam que o comprometimento com a empresa aumentou;
– 60% perceberam que o engajamento no trabalho melhorou;
– 56% afirmam que estão executando projetos de maneira mais satisfatória.
O lado da empresa
– 84% dos executivos acreditam que o piloto foi benéfico para a empresa;
– 83% perceberam melhorias nos processos internos;
– 75% notaram equipes funcionando melhor;
– 63,6% acreditam que a empresa ganhou mais visibilidade com o piloto;
– 63,6% das empresas afirmam que tiveram mais lucro em 2024 (mas a melhoria não pode ser atribuída exclusivamente à semana de quatro dias).
(Com informações de O Globo)
(Foto: Reprodução)